segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Para posteridade


Parece que foi ontem, ela ia embora para não sabe-se quando voltar e apostou numa loucura que deu certo. Entendi na marra o que significa saudade. 

Quase dois anos depois, recebeu inesperadamente uma missão que transformou sua vida por completo, pra melhor, para sempre: gerar um pequeno milagre.

E aí é que entra você, meu amor. Hoje, dia 10 de setembro de 2012, o meu mundo ficou melhor porque você chegou. Bochecha gordinha, olhinhos amendoados que mal sabem ficar abertos e um rostinho de anjo que me fez chorar copiosamente. Elis.

Queria estar aí pra ver esse bocão vermelho e esse nariz batatinha de perto, mas me contento com a foto que sua mamãe enviou. Ela é a pessoa mais feliz desse mundo.

Sei que hoje você nem sonha em ler e entender minhas palavras, mas daqui há alguns anos eu proponho que você veja e sinta o que a outra parte do meu coração está sentindo daqui do outro lado do mundo. Hoje sou metade, porque a outra está aí com você.

Provavelmente não estarei aí quando você falar sua primeira palavrinha, ou até mesmo quando aprender a engatinhar, muito menos estarei no seu primeiro dia na escola. Isso me mata por dentro. Mas prometo estar ao seu lado quando esse mundo louco parecer ser um lugar estranho, quando precisar de alguém (mesmo distante) para se abrir, falar sobre o tal menino que começou a puxar papo com você na escola, ou sobre aquela viagem que está pensando em fazer com suas amigas e ... sei lá, quando você não precisar de nada também!

Espero que, ao abrir esses olhinhos de anjo, possa ver amor em todos os lugares onde passar. Espero que, mesmo com a distância, você também me ame e pense em mim como uma pessoa que vai estar ao seu lado pro resto da sua vida.

Eu te amo.

Da sua madrinha,
Hannah.

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Re- começo.



Fazia um tempo que ela não pisava por lá. Tinha medo de pegar gosto e não querer mais sair, e dar vontade de voltar todo dia.

Ok, problema nenhum nisso tudo. A não ser por seu medo ser, de fato, de se arrepender das escolhas que fez e perceber que a atitude de retornar àquele lugar seja sinônimo de retrocesso. Ou perda de tempo, por antes apostar em algo que nada tinha a ver com tudo aquilo.

Ela pensava demais. Ainda me questiono se isso tudo é fruto de tanta leitura.

Certa vez, em meio a um caminho que fazia diariamente em direção em seu trabalho, reparou numa árvore que nunca esteve ali ao logo daqueles três longos anos. Seria tamanha distração e falta de sensibilidade? Ou seria seu coração leve, agora mais doce e aberto ao mundo a sua volta? Olha o que o medo faz.

O medo nos deixa alerta, despertos e  ironicamente preparados. É por isso que, as vezes, sentir medo não nos coloca numa posição de desvantagem, porque a gente percebe o que acontece em nossa volta de uma forma diferente, temendo e ao mesmo tempo ansiando por enfrentar aquilo que mais nos toca. E ela, no auge dos seus sonhos e na inocência de seus simbólicos 24 anos, levou um fenomenal banho de água fria que muita bonitinha por aí sequer sentiu respingar.

Tantas dúvidas.

Poderia procrastinar, fingir que não ligava, esquecer a ânsia de estar lá mais uma vez, mas aquilo parecia ter sido feito pra ela. Era ali que devia estar, para sempre. Era ali que devia estar. Para sempre.

Então, voltou. E o medo se foi.

Era só recomeçar.

sábado, 28 de janeiro de 2012

A festa




Noite de segunda-feira. De sua janela podia-se contemplar pequenos pontinhos de luz na altura das distantes mansões instaladas nos morros ao sul. Tais cores, em suas nuances fluorescentes, se observadas de certo ângulo além de sua janela, colaboravam para a decoração da sala de estar, que misturava tons fortes e bem diversificados. A noite era fria e chuvosa, mas a alegria era suficientemente acalorada.

Às vésperas de seu vigésimo nono aniversário, andou por aquela cidade antiga e pacata, cumprimentou todos à sua volta e, mesmo depois de tanto tempo, sentia-se como se não tivesse tentado a vida em outra lugar; aquele sim era o seu lugar. As suas pessoas. O seu cheiro de terra preferido. Os seus costumes.

Nove e quinze.

As pessoas chegavam, com pratos cheirosos e bem apresentados, botas cheias de lama e bochechas rosadas. Falavam alto, abraçavam forte, eram elas mesmas. O tio mais velho, precocemente afetado pela birita boa e amarga, aumentava e abaixava o volume, e achava uma "puta de uma sacanagem" o cachorro latir mais alto que o som enquanto as pessoas iam entrando, por que cargas d'água Tobias não havia sido adestrado? Agora era velho e cansado, só latia de nervoso, e morria de medo daquele homem.

As crianças eram gordinhas e agitadas. Mesmo agasalhadas dos pés à cabeça, nada as impedia de correr pelas tiras barulhentas e escorregadias de madeira, resultado de uma cuidadosa aplicação de cera e verniz, que fora engenhosamente pensada para a grande pequena noite. 

Os homens, ogros de bom coração, atendiam cautelosamente às regras de etiqueta de início de festa, observados atentamente por suas mulheres, lindas e cansadas por terem passado o dia na cozinha. 

A festa já era festa e a menina-mulher de 29 vestia um agrado de sua mãe, que nada combinava com seu estilo. Estava harmoniosamente desajeitada, mas refletia beleza e jovialidade, sabia ser bonita. Amanhã à tarde, pegaria um vôo para chegar a tempo de uma reunião importante com o mais novo presidente da multinacional que trabalhava. Quem via, não imaginava tamanha inteligência e sofisticação dentro de um par de botas e um jeans desbotado.

À meia noite, como de costume, as luzes se apagavam e as velas eram acesas. Um coro de feliz aniversário e as palmas desengonçadas davam sentido àquele momento único e especial na vida da menina de 29. Já podia sentir saudade do cheiro de terra molhada de chuva, do latido intransigente do pobre Tobias, e do abraço acalorado de seus pais, seus melhores amigos.

Aquela era só mais uma noite, em só mais um canto da cidade, mas não para aquelas pessoas que partilhavam e celebravam. Aquela noite, do outro lado do país,onde a menina vivia, poderia não ter nenhuma importância, mas ali, naquela cidadezinha simples e pacata, fora marcada pela união de pessoas que, mesmo vivendo em tão diferente realidade, sabiam ser felizes...

Feliz aniversário.