sábado, 28 de janeiro de 2012

A festa




Noite de segunda-feira. De sua janela podia-se contemplar pequenos pontinhos de luz na altura das distantes mansões instaladas nos morros ao sul. Tais cores, em suas nuances fluorescentes, se observadas de certo ângulo além de sua janela, colaboravam para a decoração da sala de estar, que misturava tons fortes e bem diversificados. A noite era fria e chuvosa, mas a alegria era suficientemente acalorada.

Às vésperas de seu vigésimo nono aniversário, andou por aquela cidade antiga e pacata, cumprimentou todos à sua volta e, mesmo depois de tanto tempo, sentia-se como se não tivesse tentado a vida em outra lugar; aquele sim era o seu lugar. As suas pessoas. O seu cheiro de terra preferido. Os seus costumes.

Nove e quinze.

As pessoas chegavam, com pratos cheirosos e bem apresentados, botas cheias de lama e bochechas rosadas. Falavam alto, abraçavam forte, eram elas mesmas. O tio mais velho, precocemente afetado pela birita boa e amarga, aumentava e abaixava o volume, e achava uma "puta de uma sacanagem" o cachorro latir mais alto que o som enquanto as pessoas iam entrando, por que cargas d'água Tobias não havia sido adestrado? Agora era velho e cansado, só latia de nervoso, e morria de medo daquele homem.

As crianças eram gordinhas e agitadas. Mesmo agasalhadas dos pés à cabeça, nada as impedia de correr pelas tiras barulhentas e escorregadias de madeira, resultado de uma cuidadosa aplicação de cera e verniz, que fora engenhosamente pensada para a grande pequena noite. 

Os homens, ogros de bom coração, atendiam cautelosamente às regras de etiqueta de início de festa, observados atentamente por suas mulheres, lindas e cansadas por terem passado o dia na cozinha. 

A festa já era festa e a menina-mulher de 29 vestia um agrado de sua mãe, que nada combinava com seu estilo. Estava harmoniosamente desajeitada, mas refletia beleza e jovialidade, sabia ser bonita. Amanhã à tarde, pegaria um vôo para chegar a tempo de uma reunião importante com o mais novo presidente da multinacional que trabalhava. Quem via, não imaginava tamanha inteligência e sofisticação dentro de um par de botas e um jeans desbotado.

À meia noite, como de costume, as luzes se apagavam e as velas eram acesas. Um coro de feliz aniversário e as palmas desengonçadas davam sentido àquele momento único e especial na vida da menina de 29. Já podia sentir saudade do cheiro de terra molhada de chuva, do latido intransigente do pobre Tobias, e do abraço acalorado de seus pais, seus melhores amigos.

Aquela era só mais uma noite, em só mais um canto da cidade, mas não para aquelas pessoas que partilhavam e celebravam. Aquela noite, do outro lado do país,onde a menina vivia, poderia não ter nenhuma importância, mas ali, naquela cidadezinha simples e pacata, fora marcada pela união de pessoas que, mesmo vivendo em tão diferente realidade, sabiam ser felizes...

Feliz aniversário.

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